A POESIA NA DIÁSPORA
Quem é que disse que a Poesia
É apenas e só verdadeiramente
Uma aura de dimensão estanque,
Sendo o seu palco reservado
Para umas tantas elites
Mascaradas de carisma artístico?
Quem é que disse que a arte poética
É tão só a coutada dos eleitos
E que habita no seu tabernáculo
Envolta por um camuflado destino?
Quem é que disse que fazer poemas
É como que uma caminhada
Para um ocaso indeciso
Na periferia da metafísica?
Quem é que disse que fazer poesia
Só está ao alcance de predestinados
Que trocam a indumentária conforme
É dia útil ou fim-de-semana?
Quem é que disse que os poetas
Não pertencem a este Mundo
E que, para certos discursos
No arrumar das letras,
Precisam de mudar de identidade?
Quem é que disse que para se ser poeta
Não há mister de inspiração…
Bastando ser louco,
Como se a loucura possa ser
Apenas circunstancialmente
Um varandim entre o banho-maria
E a academia feita habilitação?
Quem é que disse que para poetar
Nada custa, porque ela afinal
Já vive incrustada na alma lunática
De viandantes entre oásis
Restando-lhes apenas
Que chegue a sua hora
Na clepsidra sempre-eterna
Do próprio tempo?
Não! A Poesia - como arte que é -
Pela essencialidade das coisas
É tão só, e apenas em si mesma,
Um modo de estar no Mundo.
Sim! Porque o modo de estar no Mundo
Outra coisa não é que ser Vida,
Ser realidade, ser consciência,
Ser emoção e sentimento.
Ser Poeta implica ser capaz de pensar,
Ser capaz de sentir e ser capaz de agir!
Porque a Poesia, na sua Identidade,
É íntegra e dinâmica:
Eleva-se do leito pela manhã,
Respira o ar puro pela janela,
Alimenta-se do frugal para existir
E vai por aí, de beco em beco,
De rua em rua, de senda em senda,
De horizonte em horizonte.
Porque a Poesia tem olhos para ver,
Tem alma para re-parar,
Tem tacto para dinamizar
E senso para se exercitar
Na balança do fazer e do haver.
Porque a Poesia tem gosto para optar,
Para seleccionar e partilhar
De espaço em espaço,
De pessoa em pessoa
E de ser em ser!
Porque a Poesia tem arte para crescer,
Tem sentido para comunicar,
Tem energia para cantar e sorrir.
Porque a Poesia não é enfeite,
Não é moda nem persuasão:
Ela está no mundo simplesmente
Para ser, para recriar e transformar
Todo o sentido da Vida!
Ela brota da lira do poeta
E afirma-se no sonho
E na voz dos trovadores,
Numa Diáspora de luz
E num farol vigilante e altaneiro.
Ela é barco no mar,
É pássaro no ar,
Enxada e charrua na planície
E é bola no recreio primaveril.
Ela é água corrente no ribeiro
Que passa saltando de pedra em pedra,
É brisa que sopra
No rosto dos namorados,
É vento que se agita
Nas copas dos pinheirais…
Ela é cristal, é música, é dança
E é lobo na floresta;
É nuvem carregada de lágrimas,
Filho no ventre, antes de nascer,
E grito revelado à luz prenhe de sol.
Ela ciranda pelas veredas
Dos monturos sem fim
E nas algemas sangrentas
No drama dos sem-abrigo
E na apoteose dos banqueiros.
Ela é fruto que cai mas ninguém colhe
Porque o tempo da colheita
Não será propício
Ou ainda não é hora de chegar.
Ela é esperança, confiança
E perseverança,
Mas o fermento porém
Tarda a levedar.
Ela é criança e adulta
E anseia, movendo-se
Na maré interminável de um futuro
Que há-de vir, anunciado
Pelo som do branco campanário.
Ela é cajado de romeiro,
É manto breve de firmamento,
É lanterna na brumosa noite
E uma estrela à deriva
Numa saudade penitente!
Poesia é Mundo, poesia é Vida,
Poesia é guerra e paz
Na busca de um abrigo
E de um Amor!
Frassino Machado
In ODISSEIA DA ALMA