quarta-feira, 29 de junho de 2016

SENHORA DO XAILE NEGRO


Amália da Piedade Rodrigues (Lisboa, 1 de Julho de 1920 — Lisboa, 6 de Outubro de 1999)


SENHORA DO XAILE NEGRO

(A Amália Rodrigues)


Senhora do xaile negro,
quem lhe enfeitiçou a garganta?
O seu peito ainda harpeja,
enfeitiça a quem deseja,
e encanta quando canta.

Senhora do xaile negro.
Senhora do negro xaile,
sua voz ainda ecoa.
Vai dos Prazeres ao Castelo,
canta uma marcha num baile,
anda a enfeitiçar Lisboa.

Como uma gaivota no Tejo,
em torno duma falua.
Ao seu velame se amarra.
Fez do leme uma guitarra,
sardinheira à luz da lua.

Senhora do xaile negro.
Senhora da voz magoada,
nas vielas ainda ecoa.
Anda a cantar por Lisboa
até vir a madrugada.

Senhora do xaile negro,
da nostalgia e ansiedade
Fez do fado o seu destino,
caminheira da saudade.

Senhora do negro xaile,
outro mais negro não vi.
Tem nas franjas do seu xaile
rosas que não lhe ofereci.

Senhora do xaile negro,
foi de todas a primeira.
Ó deusa da humildade,
encantou a humanidade,
foi rainha sem fronteira

Senhora, teu xaile negro,
foi tecido na Moirama.
Deixaste-o quando partiste,
nos versos dum fado triste
no coração de Alfama.

Manuel Manços Assunção Pedro