VAMOS CANTAR AS JANEIRAS



VAMOS CANTAR AS JANEIRAS


Natal Dos Simples


Vamos cantar as janeiras
Vamos cantar as janeiras
Por esses quintais adentro vamos
A raparigas solteiras

Vamos cantar orvalhadas
Vamos cantar orvalhadas
Por esses quintais adentro vamos
A raparigas casadas

Vira o vento e muda a sorte
Vira o vento e muda a sorte
Por aqueles olivais perdidos
Foi-se embora o vento norte

Muita neve cai na serra
Muita neve cai na serra
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem tem saudades da terra

Quem tem a candeia acesa
Quem tem a candeia acesa
Rabanadas pão e vinho novo
Matava a fome à pobreza

Já nos cansa esta lonjura
Já nos cansa esta lonjura
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem anda à noite à ventura

© Zeca Afonso







ANO NOVO, IGUARIAS VELHAS

  
Por alturas da anual passagem
Cada lar, debaixo de telhas,
Percorre em histórica viagem
Ano novo, iguarias velhas.

Do Natal até ao Ano Novo
Mil iguarias são roupagem
Todavia gasta mais o povo
Por alturas da anual passagem.

Couves, batatas, bacalhau
Várias bebidas em botelhas
Especiarias a dar co´ um pau
Cada lar, debaixo de telhas.

Quer na cidade, quer na aldeia,
Toda a gente faz homenagem
À tradição, e como feliz ideia,
Percorre (-a) em histórica viagem.

Ninguém se importa co´ a despesa
Nem sequer franze as sobrancelhas,
E usa com prazer e firmeza
Ano Novo, iguarias velhas.

Sonhos, rabanadas e aletria,
Bons mexidos e pão-de-ló,
E, não se usando de cortesia,
Logo se entoa o só-li-dó.

Faz-se jus à boa barriga
E os olhos gostam de comer
Haver sobras já se mendiga
Qu´ há roupa velha pra fazer.

Até as sobras são iguaria –
Corram-se os ratos pró labirinto –
De tudo se pode fazer poesia
Com inspiração e com instinto…

Se um Ano Novo é vida nova,
Não convém, pois, nada estragar,
Há que pôr a intuição à prova
Com receitas para compensar.

Cantemos loas ao Ano Novo,
Com versos de boa vontade,
A alma precisa de renovo,
De emoção e vitalidade.

© Frassino Machado
In INSTÂNCIAS DE MIM







VIMOS AQUI CANTAR AS JANEIRAS


Ó Senhores um Bom Ano a todos!
Vimos aqui cantar as Janeiras
Com boa vontade e maneiras
Ao luar de Janeiro que sonhámos.

Ó Senhores são trezentos e tantos dias
P'la estrada sem eira nem beira!
Uns pastelinhos de bacalhau, à vossa beira,
Vinham a calhar! Ah, palmilhámos léguas!

Uns pastelinhos de bacalhau, à vossa beira!
Há trezentos e tantos dias na geladeira
Pra cozinhar as demais iguarias dos Reis,
Vinha a calhar o bolo-rei todo o dia seis!

Ó Senhores venha de lá esse belo regaço
Com a certeza de que ainda levam abraço!
Somos gente do bem e pedimos equidade,
Paz na terra aos homens de boa vontade.

Ó Senhores venha de lá esse infinito milagre
Com a certeza que hão de ser abençoados!
Somos gente da terra que pão, azeite e vinagre
A vós pedimos pros de bens confinados.

Cantando as Janeiras lado-a-lado ofertamos
O retrato genuíno de coisas que sonhámos
Enquanto passávamos noites de sobressalto
Com a garganta seca! Ah, o vinho novo lá p'lo alto!

Cantando as Janeiras lado-a-lado partilhamos
O valor da arte de cozinhar em casa portuguesa
De Janeiro a Janeiro, de mão cheia com certeza!
A essência do que somos enquanto seres humanos.

Vimos aqui cantar as Janeiras
Com boa vontade e maneiras,
Ó Senhores agradecemos a vossa atenção!
Somos gente simples e de bom coração.

Ó Senhores um Bom Ano a todos!
Vimos aqui cantar o que é de todos!
Venha de lá esse peru regado a porto
Pra festejarmos o Ano Novo no conforto!

Cantando as Janeiras lado-a-lado
Em casa portuguesa há paz e poesia,
Ninguém ralha e todos têm razão!
Todos juntos na tristeza e na alegria!

Cantamos d' alma e coração p'los Reis,
Ó Senhores oiçam a prece da verdade!
Vinha a calhar o bolo rei todo o dia seis!
Somos gente simples e de toda-a-idade.







CANTATA DOS REIS  | QUADRAS 

(para cantar na consoada dos Reis)


Nesta casa afortunada
Em cada ano ouvireis
Até alta madrugada
O nosso cantar de Reis.

Vimos lá do Oriente
À luz da estrela dourada
E trazemos um presente
P’ ra família abençoada.

Vimos três, mas somos mais,
Os outros estão a chegar
Já lá vêm nos quintais
Para connosco cantar.

À patroa deste solar
Por quem temos muita estima
Vamos-lhe à luz do luar
Cantar a primeira rima.

Ao calor dessa lareira
Mais vossa filha formosa
Ela será vossa herdeira
E vós a feliz ditosa.

Ao ilustre senhor patrão
Queremos todos dizer
Do fundo do coração
Há-de um dia enriquecer.

Não sabemos se há mais gente
Nesta casa acolhedora
Sabemos só qu’ é bem quente
E não queremos ir embora.

Nós somos gente de bem
Mas sabemos bater o pé
A quem s’ esquecer porém
Da família de Nazaré.

Somos reis sem ter dinheiro
Não temos ouro nem prata
O coração está primeiro
Nesta vida tão ingrata.

Recebam mui prazerosos
Esta bênção do Senhor
Que trazemos generosos
Para um futuro melhor.

Numa noite que faz dó
Queremos apenas pedir
Um pouco de pão-de-ló
Embrulhado num sorrir.

E já agora para animar
E aquecer nosso caminho
Venha daí a saltar
Uma caneca de vinho.

Tenham saúde e bom pão
Haja alegria e amor
Cumprimos a tradição
Com a graça do Senhor!

© Frassino Machado
In MENSAGEIRO CANTANTE






ESTA, MINHA, JANELA


Lembro que hoje é um dia muito especial,
Que em tempos festejava em alegria,
Dia de Reis, que em toda a parte era igual;
Havia bolo-rei à mesa e nas ruas poesia.

Cantavam as Janeiras de manhã à noite;
Havia vivacidade e cantigas genuínas.
Tempo de saborear o fruto das romãzeiras
No seio da família e desejar muita sorte.

Os tempos eram outros, mas, a minha imaginação
Diz-me que há-de ser outra vez dia de Reis!
Esta, minha, janela abre-se hoje, dia seis,
Sei que algures está a romã do meu coração.

© Ró Mar



RESPIRO ROMÃ


Saindo à rua, repleta das melhores intenções,
Levo a bagagem no coração e pela alma paixões,
Que outrora tive; vou em busca da cobiçada romã,
Levo à mão a lapiseira, para desenhar o amanhã.

Sinto o tempero do dia pelo desejo em mim
De ter um dia feliz, pelo menos mais uma vez,
A imaginação conduz-me a um lugar tão assim:
Onde há verde próspero, há frutos; é a minha vez…

De trautear as Janeiras, saboreando meus desejos,
Respiro romã... sinto aos lábios os beijos
D' um amor de múltiplas sementes e polpa vermelha.

Um dia maravilhoso… porque assim o quis...
Refresco a minh' alma pela paisagem do dia que fiz;
Entretanto, é noite de Reis e trago no coração a centelha.

© Ró Mar