terça-feira, 15 de janeiro de 2019

ANO VELHO, ANO NOVO




ANO VELHO, ANO NOVO  


“Trovas de Fim de Ano”


Quero estas trovas cantar
Frente a frente co´ o espelho
Pela saída do ano velho
Que ´stá prestes a acabar.

Durou tanto o velho ano
Por nunca encontrar renovo,
Vinho velho, vinho novo
Corra hoje no mesmo cano. 

Nem tudo foi de primor,
Doze meses ao desafio,
A água que corre no rio
Foi indo de mal a pior. 

Já não abundam esperanças
Pois qu´ anda tudo às avessas
O que é novo não tem pressas
Seja em adultos ou crianças.

Não se vê rosto a sorrir
Nem há bocas para cantar 
Vê-se gente a andarilhar 
De mão estendida a carpir. 

Os ricos, sempre mais ricos
Com dinheiro pra derreter
A justiça, não dá para ver,
E as leis disfarçam fanicos. 

Os pobres, sempre mais pobres
E a cada hora muitos mais,
Não há governos nem arrais
Sem haver princípios nobres. 

Os pais confundem os filhos
Pelo exemplo que lhes dão, 
Os filhos estão como estão
E não passam d´ empecilhos.

A Escola não tem remédio já, 
Sem bom professor nem mestre
Não há ensino que preste
Nem esperanças no amanhã.

Se há emprego é com´ aspirina,
E os patrões já são de sobra, 
Não há investimento nem obra
Mas há negócios da China. 

A terra ninguém a trabalha
Quem o faz já é sortilégio, 
Ter dinheiro é um privilégio
Quanto a sorte, Deus-nos-valha.

O senhor prior é o que se vê
De mão estendida pra esmola
Enquanto o povo s´ esfola
Ele, em casa, consome a Tv.

Já nem percebe de missa
E já esqueceu o breviário,
Como padre anda ao contrário
Trabalha pouco e tem preguiça.

Dá-se bem co´ o regedor
E tem-no em suas palminhas
O povo que vá prás alminhas
E dê graças ao Senhor. 

A Fé não há quem a tenha,
Dentro da igreja ou capela,
Ninguém tem urgência dela
Nem há mal que daí venha.

A aldeia é um ar que lhe deu
Co´ os fiscais sempre na ordem
Mas, porém, pouco já podem
E, se o podem, “dá cá o meu”.

Há projectos pantomineiros
Em hipermercado ou em feira, 
Há pedintes sem eira nem beira
E há oportunos arruaceiros.

Nunca há culpa nas desgraças
E quase não há segurança
Ninguém entende tal dança
E as razões destas devassas. 

Há pulhices nos tribunais,
Ministros brincam co´ a tropa,
Sem-abrigos comem da sopa
Que faz inveja aos pardais. 

Há lições no Parlamento
Com sessões mirabolantes,
Não há moral como dantes
E o Poder é um cata-vento. 

Em Belém mora o afecto,
Moram selfies e sorrisos,
Entre infernos e paraísos
Vai gozando quem é esperto.

O Zé odeia qu´ o tomem
Co´ ilusões e fantasias,
Mas usa as tecnologias
Para provar que é homem. 

Ninguém pode cair doente
Toda a gente finge saúde,
Há mais farra do que virtude
E ao futuro ninguém o sente. 

Ano velho ou Ano Novo
Aconteça o qu´ acontecer
A Sorte é o que Deus quiser
O resto sobra para o Povo.

Diz o povo e tem razão
"Ano Novo, vida nova",
Mas é urgente pôr à prova
A força do coração.

Estas Trovas são o que são,
Com teatro e com ironia,
Vestem a roupa da Poesia
No que é real ou ficção! 

Frassino Machado

TROVAS DO QUOTIDIANO