segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

COM O CORAÇÃO NA MÃO




Mote:


Quantas sedas aí vão
Quantos brancos colarinhos
São pedacinhos de pão
Roubados aos pobrezinhos!

© António Aleixo

*

COM O CORAÇÃO NA MÃO


I

Ah, quanta mordomia
S´ alardeia, falácia a mais
E perspicácia demais
P'ra colmatar a miséria,
Não s´ aguenta tanta léria!
Muitos vivem com o coração
Na mão, falta-lhes o pão
Na mesa e nada s' espera
Que lhes dê razão, pudera,
"Quantas sedas aí vão"!?

II

Quantos saltitos altos
Ignoram o chinelar!?
Deve de ser p'ra não dar
Nas vistas, ou são arautos!?
Deve haver muitos asfaltos
E também muitos mesquinhos
Para tantos coitadinhos!
- Por favor e obrigado,
Repete-se o enrugado;
"Quantos brancos colarinhos"!

III

Quantos são os engravatados,
Que com chauffeur e lacaio
Veem os pobres de soslaio;
- Devem estar encharcados!
Chove, não é p'ra todos,
O pé fora do carrão
Só à porta do casarão;
Finórios, que dão migalhas
E mais umas quantas tralhas;
-"São pedacinhos de pão"!

IV

Ah, tamanha pequenez
De carácter, avareza!
Para quê tanta riqueza?
Porquê tanta escassez?
Porque não mais sensatez?
Quantos são os saláriozinhos
Pelos errantes caminhos!
Ah, são tantos os desalentos
Causados por mantimentos
"Roubados aos pobrezinhos!"

© Ró Mar | 01/2022