ÍNVIO DESTINO
Antes de saber ler, contar, escrever,
Quando ainda projecto de uma vida,
Olhava à minha volta a perceber,
A humanidade um túnel sem saída…
A incompreensão me amordaçava,
Não me deixando ser bondoso e justo
Tal qual o coração me ordenava,
E contra a qual ainda barafusto!
Talvez seja condão, ínvio destino,
Ter de sentir a dor e o sofrimento;
Ser pela paz no mundo, peregrino
E não ter paz em mim um só momento…
Ser da palavra amor o mensageiro,
Instigador no palco da razão…
Nesta forma de dar meu corpo inteiro,
Como se eu fosse apenas coração!...
Às vezes penso ouvir-me no deserto,
Onde ninguém me ouve nem me lê,
Os gritos lancinantes que liberto,
Como que a perguntar: porque? porquê?
Responde-me o silêncio surdo e mudo,
Orgulhoso que pensa saber tudo
Mas na torpe ignorância se revê!...
José Manuel Cabrita Neves