sábado, 5 de setembro de 2020

O OLEIRO


OS CÂNTAROS DE BARRO


QUEM LEMBRA?


Onde estarão os cântaros de barro?
Cântaro de barro
Que nasceu da mão do oleiro,
Cântarito, guardando água
Da neve que escarpe a mão desnuda,
Perante a mão que se fechou.
Onde o verbo se acercou do golpe
De uma alma antiga.
Cântaro de barro, objecto relíquia,
Brilho que o consolo não alcança,
Brilho.
Dos mortos,
Quase mendigos.
Cântaros de barro, termos aflitos
Que tanta vez deixou a asa
Na fonte de águas claras, abençoadas.
Na respiração de cinzas enfiada,
Alma fatigada, pelo trabalho árduo
Pela lavoura e a enxada.
Hora passava, hora chegava
Com respiração de cinzas confinadas,
Hora passava, hora chega
Da fonte, com sua talha de barro avermelhada,
Ante o sombreamento das pálpebras
E olhos fechados durante o sono,
Moedor de puras almas.
Cântaro de barro, prato de sopa,
Não procures nos meus lábios a tua boca,
Nem na minha porta o estranho
Púcaro de barro...
Tantas noites mais acima,
Passava o oleiro com sua terra púrpura,
Para fazer o pote, para fazer o vaso
E o cântaro com asa frágil,
Mas a calmaria veio e a tempestade veio,
E todos os oceanos vieram reunidos...
Lavando o barro e tu escavavas e o verme ainda escava,
E aquela música remota diz: eles cavaram.
Oh tu, oh ninguém, oh nenhum:
Pra onde foi se não fez nada,
O oleiro e sua terra avermelhada?
Extinguiu-se para sempre
O cântaro de água fresquinha...
A eternidade está cheia deles,
Ali, desintegrando-se,
Aquele que fazia a roda rodar
No termo em que apareceu
Como profissão, o oleiro a trabalhar.
O que podemos dizer
Duma profissão quase extinta?
Eles outras preferiram,
Retiraram-se com um simples gesto
Como quando tudo começou.
O oleiro quase dançou,
Extinguiu-se com outro oficio,
Da terra moldada, penas restou...
A dança de duas pequenas palavras,
De Outono, de sede, de nada!

© NanáG.